quinta-feira, 13 de novembro de 2014

Carta aberta à comunidade de Guaíba

AMA tem pautado, ao longo de 20 anos, a defesa da preservação da memória e da história do município de Guaíba. Temos uma aprofundada vivência no campo das relações simbólicas, afetivas e das manifestações concretas da caminhada política, econômica, socioambiental e cultural de Guaíba. Essas manifestações se traduzem através da existência do Patrimônio Material e Imaterial de nossa localidade.

Sabemos do conjunto de documentos históricos que o território municipal abriga na zona rural e urbana. Conhecemos os atuais conceitos que norteiam a difícil tarefa da preservação em um mundo regrado pelo consumismo e pelo descartável. A busca da felicidade, da ostentação e do sucesso a qualquer custo, mesmo que para isso tenhamos que nos distanciar de nossa essência, a humanidade, reflete um cenário falido, mas ainda convincente para muitas mentalidades e para as relações econômicas vigentes. As questões sociais também circulam pelo direito à história e pela construção da identidade coletiva. Temos que burilar as sensibilidades e vibrar com os comportamentos que nos religuem à nossa terra, nossa história e memória.

O tema do Patrimônio Histórico não se trata de mero devaneio pessoal ou de grupo. O cabedal de conhecimento sobre o assunto está expresso nas Cartas Patrimoniais – UNESCO e na Constituição Brasileira desde 1937. O direito à memória e à história coletivas está diretamente relacionado com o dever da Nação, do Estado e do Município. Ao longo destes últimos 20 anos em Guaíba, temos visto o desmanche acelerado dos bens de interesse Histórico, Arquitetônico e Artístico. Os que ainda resistem, possuem como esteio de apoio a intervenção do IPHAE (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado), do Ministério Público, da AMA e de alguns indivíduos que se colocam como sujeitos de sua história e da história coletiva. As gestões municipais não têm apresentado políticas de governo eficientes e muito menos convincentes.

Os últimos acontecimentos que envolveram a destruição de prédios de valor histórico e arquitetônico na cidade, mais especificamente na Avenida Sete de Setembro, nos remetem à constante indagação: O que queremos para Guaíba? Outra pergunta se faz necessária para dar condução ao debate: Que estratégias utilizaremos para a preservação de nossa História? A AMA pode responder a esta pergunta dizendo que, para tanto, precisamos começar dando início urgente ao Inventário Histórico e Cultural de Guaíba e por em ação o Conselho Municipal de Patrimônio Histórico, Artístico e Cultural do Município, que não tem sido chamado desde sua reedição há dois anos.

Os vários eixos que conduzem à preservação ambiental e cultural precisam ser ordenados e regidos com maestria pelo poder público, porém, concluímos que até o presente momento Guaíba não teve o prazer de ver a orquestra da preservação patrimonial fazer seu espetáculo de forma harmônica e consistente. No momento em que vivemos, nosso município vem recebendo inúmeros investimentos que estão, de forma muito acelerada, transformando o cenário urbano, econômico e social de nossa cidade, requerendo ações imediatas para que não sejamos atropelados pelo desenvolvimento, sem torná-lo inconsequente, mas harmônico com nossa realidade, características e história. Para finalizar, citamos a historiadora Sandra Jatahy Pesavento, que escreve o prefácio do livro intitulado “O Passado no Futuro da Cidade”, de autoria de Ana Lúcia Meira (2004), grande ativista da área da Cultura no Brasil:

“(...)Dar a ver o passado de uma cidade é fazê-la ir ao encontro da História, da sua História, de um caminho percorrido, de uma experiência comum, de um tempo partilhado. Este tempo a ser lembrado, visualizado, é uma parte da vida da comunidade que toma espaço na vida de cada cidadão e que o habita para pensar à frente. Daí porque é possível ver passado e futuro em conjunção, mas para isso, é preciso saber ver(...).”


Miriam Leão: historiadora e consultora de patrimônio da AMA.
João Bosco Ayala: historiador e coordenador de patrimônio histórico da AMA.